terça-feira, 9 de junho de 2009

Um Reflexão ou desabafo...

Este artigo é dedicado a minha amiga Merikol

Desenvolvimento sim! Mas qual desenvolvimento e para quem?

A estrada de terra que me leva a Patrimônio, um simples, pobre, mas aconchegante distrito do município de Paraty é muito esclarecedora do momento que vivemos hoje. Trata-se de um tempo de escolhas, de decisões, de pensar no agora ou no amanhã. É na verdade, uma espécie de espelho, espelho meu ou oráculo de nosso tempo.
Tive a oportunidade, dia desses, de passar por um dos novos moradores do entorno desta estrada que exige tração nas quatro rodas e tempo bom para ser vencida. Trata-se de uma criança de nove anos, Pedrinho, filho, neto, bisneto, tataraneto de pescadores caiçaras da baía da Ilha Grande e Paraty. Ele corria para sua casa, com caderno e lápis, vindo da escola há quatro kilometros dali. Lá era esperado por seus seis irmãos, seu Valdomiro, o pai e pescador renomado, dona Itelvina, mãe e responsável pela melhor moqueca caiçara feita todo domingo, com robalo e banana cozida no forno a lenha. A casa simples, de apenas três cômodos, feita em pau-a-pique revela o improviso da família que antes habitava uma ilha perto de Itaguaí. Cumprem-se seis meses desde que foram morar ali. Precisaram desocupar sua antiga casa quando o pescado sumiu, muito provavelmente por conta da construção do porto de Sepetiba, uma das mais importantes obras em andamento no país representando um dos maiores investimentos privados da ordem de cinco bilhões de dólares e que será capaz de escoar toda a produção de minério de ferro e aço da multinacional alemã que ali se instalou em parceria com a privatizada, porém enxuta e bem sucedida, Vale.
A família de seu Valdomiro é apenas uma das cerca de oito mil outras famílias de pescadores da região de Itaguaí, Sepetiba e adjacências. Muitos já se foram desde que as obras começaram, comunicam que o pescado, seu sustento, sumiu. A empresa responsável pelo porto e pelas obras contesta e afirma que serão gerados cerca de vinte mil empregos diretos e que a região se tornará em um dos grandes pólos de geração de desenvolvimento do país. Na verdade, a obra está em sintonia e é crucial para o sucesso do PAC no Estado do Rio de Janeiro. O governador do Estado e o próprio presidente da república fizeram questão de participar das comemorações desta festejada obra que tem financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social).
Aliás, é importante se dizer que vivemos um momento sui generis no desenvolvimento nacional. O PAC é certamente, uma das mais importantes propostas de desenvolvimento já vistas no país. Não se via um canteiro de obras tão copioso desde os tempos de Juscelino Kubitschek. O PAC é um esforço programado e planejado de desenvolvimento. Mesmo só tendo atingido 3% de sua meta, segundo a fala da atual chefe da casa Civil Ministra Dilma Houssef, este programa já pode ser considerado um dos grandes momentos da história do desenvolvimento de nosso país.
Os beneficiados deste desenvolvimento já podem ser reconhecidos. São corporações, empresas, bancos que se consolidam como os maiores do mundo. Além disso, o país tem atraído capital estrangeiro, grandes empresas têm lucrado aqui enquanto fecham as portas em seus países sede por conta da crise que, aliás, por aqui parece ser apenas uma marolinha. No entanto, entre os beneficiados e os que se regozijam neste momento, certamente entre eles não está Pedrinho, nem seu Valdomiro e família.
A sua ausência pouco notada é, no entanto, reveladora. Ela nos evidencia um outro lado do progresso, um lado sombrio que revê leis, princípios,valores. Um lado capaz de contrariar conquistas sociais, ambientais dos anos sessenta, setenta, um lado que se esquece dos índios, pescadores, quilombolas, miseráveis, favelados, sem terras e todo tipo de gente invisível deste país, mas que, no entanto, é a maioria e a que ainda insiste em ser a nossa brava gente brasileira.
É certo que precisamos do desenvolvimento, mas precisamos perguntar também qual desenvolvimento? Precisamos qualificá-lo, pensar no que é que estamos chamando de progresso. Qualificar o desenvolvimento significa atribuir sentido a ele, atribuir um predicado, uma destinação. Não podemos pensar apenas no desenvolvimento econômico, sem incluir as pessoas e seus ambientes. Não queremos des-envolvimento, ao contrário, precisamos envolver as pessoas, incluí-las. Isto pressupõe o respeito e reconhecimento pelos seus modos vivendi, significa respeito e consideração aos ambientes naturais. É por este viés que somos atravessados pela perspectiva da sustentabilidade, da preservação ambiental.
A região onde hoje se localiza o porto de Sepetiba era um imenso manguezal. Não podemos mais ceder a este modelo de progresso que visa o desenvolvimento econômico e que destrói nossa biodiversidade e nossa sociodiversidade, trata-se de um momento de escolhas, de decisões, se queremos um futuro melhor para nós mesmos ou para nossos filhos e netos. Naquele dia o caderno de lições que Pedrinho trazia da escola tinha uma tarefa para casa: faça uma redação sobre a importância de cuidar da natureza. Precisamos todos nós desta lição de casa.

Celso Sánchez

Artigo publicado na edição de 12 de julho do COMUNICANDIDO e no site http://uvaonline.uva.br/mkt/template_portal_uva/janela.asp?codConteudo=9008
em 12 de junho de 2009

6 comentários:

Unknown disse...

Olá meu amigo que bela surpresa saber que este post foi dedicado a mim, mas que pena saber que a região de Sepetiba está sendo tratada desta maneira pelo governo.

Atualmente, aqui onde moro, também tenho observado o descaso de nossos políticos com relação a população, principalmente no que se diz respeito a educação e cultura.
Se quisermos deixar algo de positivo para os nossos filhos, temos que começar desde já a lutar pela melhoria destes e outros setores que andam precários em nosso país.

Parabéns pelo excelente texto.

Beijo grande.

Merikol

Anônimo disse...

Celso,
Obrigada pelos grandes ensinamentos que deixaste em mim.

Abraços de uma aluna.
Vanessa

sa disse...

oiii, blog maneiro o blog bjuss "Sara" do (paulo freire 1010. )

Anônimo disse...

oie!!!!
blog maneiro....
bjinhoss Pamella [colegio Paulo Freire]

Unknown disse...

Olá, Celso, fui sua aluna no AVM, alguns anos atrás.. descobri seu blog por acaso, estava circulando entre amigos no orkut e dei de cara com o seu, não consegui deixar um recado, entrei aqui pra dar uma sacada nos seus escritos e fazer contato..
Gostei da proposta do seu blog, como tb gostava bastante das suas "loucas" aulas.. precisamos desse espaço de discussão e ação. Parabéns pela sua dedicação.
Grande beijo!
Drix Brites.

Flávia disse...

Olá prof. Celso... estou passando por aqui só para te dizer que a turma que foi sábado à Itaipu ADOROU a experiência! O comentário na aula de ontem foi esse! Os que não foram morreram de inveja!! kkk
Passeio fantástico! Só vc mesmo pra nos proporcionar uma tarde como essa!
Já até postei no meu blog um texto a respeito!
Um grande abraço.
Flávia (sua aluna no Curso de Especialização em Educação Ambiental - PUC-Rio)